sábado, 19 de novembro de 2016

VENENOS QUE CURAM !


Os venenos de animais, que são tão perigosos aos humanos, são ricos em proteínas e frações de peptídeos, e quando entram no organismo tentam achar as células-alvo impedindo a coagulação sanguínea ou bloqueando as funções das células nervosas. 
Esse vilão, entretanto, com a intervenção da ciência, pode ser usado em favor de nossa saúde.

A Food and Drug Administration dos EUA (FDA) é um órgão do governo americano responsável pelo controle dos alimentos, tanto de consumo humano quanto de animal, suplementos alimentares, cosméticos, equipamentos médicos e medicamentos (humano e animal).

A FDA também fiscaliza todas as substâncias que pretendem entrar para o mercado, e testam e estudam o material antes de liberar a sua comercialização. Há 30 anos, a FDA aprovou uma droga, que é um veneno derivado de uma cobra, chamado Capoten, destinado à terapia de pessoas hipertensivas.


Muitas drogas derivadas de veneno já foram aprovadas e comercializadas para o tratamento de doenças cardiovasculares.Toxinas que auxiliam no tratamento de doenças autoimunes.
O desafio da Ciência neste momento é criar, a partir de venenos, uma droga que trate a dor crônica, e doenças autoimunes tais como esclerose múltipla e artrite reumatoide.
Glenn King, biólogo molecular e pesquisador de venenos de aranhas da Universidade de Queensland, em Brisbane, na Austrália, mostrou-se muito otimista em relação à nova pesquisa:
 “Nós estamos realmente no início de algo emocionante, e vai ficar melhor ao longo da próxima década”, prevê King em uma entrevista à The Scientist.


A Anêmona-Sol (Stichodactyla helianthus) possui um tipo de veneno muito interessante aos olhos dos cientistas. Essa espécie de anêmona marinha vive nos recifes do Caribe e usa seus tentáculos verdes (também podem ser amarelados) e tóxicos para atrair suas presas.

Segundo uma pesquisa realizada na década de 90, uma dessas toxinas, presentes em seus tentáculos, um peptídeo chamado SHK, é um potente inibidor de um canal de potássio de linfócitos T chamado Kv1.3. 
A regulação desse linfócito implica diretamente no desenvolvimento de doenças auto-imunes, isto é, o SHK poderia evitar o aparecimento dessas doenças.
Sendo assim, os cientistas tentam de alguma forma desenvolver uma substância terapêutica com base no SHK. Christine Beenton, bióloga molecular do Baylor College of Medicine, argumenta que o SHK é muito potente como um inibidor do linfócito Kv1.3, mas ao mesmo tempo ele bloqueia canais importantes encontrados nos neurônios. 
“Você não vai querer injetar [o SHK] em seres humanos, sabendo que isso poderia bloquear os neurônios, e não saber o que se poderia fazer para reverter”, diz Beenton.
A bióloga estudou toda a estrutura do SHK e testou cerca de 400 tipos diferentes de derivados sintéticos deste composto. Ela e a equipe incluíram elementos que tivessem a função de não bloquear os canais de células ligadas aos neurônios. 
Elaborou-se assim, o SHK-186, o número 186 indica a sua versão, um composto que elimina qualquer efeito colateral previsto.
Em roedores diagnosticados com esclerose múltipla, o SHK-186 foi utilizado como terapia, e comprovou-se que a droga consegue reverter à paralisia gerada pela doença. “Nós vimos à doença ir embora quase que completamente.
E o importante é que a droga não bloqueia o sistema imunológico, já que os animais tratados ainda conseguiram combater a clamídia e a gripe”, diz a bióloga.
A equipe se animou ainda mais quando o primeiro teste em humanos saudáveis foi feito com o SHK-186. Embora os resultados ainda não tenham sido divulgados oficialmente, Beenton contou que todos estavam “muito felizes com os resultados”.
A SHK-186 tem tudo para ser uma grande promessa no tratamento de doenças-autoimunes. É o que afirma o biólogo Glenn King: “O SHK é um dos exemplos mais interessantes [de drogas derivadas de venenos] no momento. Se for aprovado, as implicações serão profundas”.


ShK-186 and ShK-192 reduce disease severity in chronic relapsing-remitting experimental autoimmune encephalomyelitis in DA rats. A, Effect of vehicle-, ShK186- and ShK-192-treatment in rats with CR-EAE. ShK-186 and ShK-192 were administered by once daily subcutaneous injections, both at 100 m g/kg/day. Treatment was started at the onset of disease (clinical score 1⁄4 1) Cumulative p value from repeated-measures two-tailed ANOVA for both ShK-186 and ShK-192 is p < 0.001. B, Effect of treatment with ShK-192 at 100 and 1 m g/kg/day in rats with CR-EAE (cumulative p < 0.001). Clinical scores : 0.5 1⁄4 distal tail limp; 1 1⁄4 loss of
Fonte: https://www.researchgate.net

Toxinas que auxiliam no tratamento da dor crônica.

O analgésico Prialt é o único aprovado em 2004, até o momento, com base em um veneno do Caracol Cone (Conus magus) (o Jornal Ciência já publicou um especial sobre esse caracol) que atua no sistema nervoso humano bloqueando um canal de íons de cálcio nos neurônios e, inibindo assim, a capacidade das células de transmitirem sinais de dor para o cérebro.
Tudo indica que um novo veneno derivado possa virar analgésico também. Os pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CRNs), de Paris, anunciaram a descoberta de dois peptídeos isolados da Mamba-Negra (Dendroaspis polylepis), umas das cobras mais venenosas do mundo.

Essa espécie de cobra, encontrada geralmente no continente africano, mede aproximadamente entre 2,5 metros a 4,5 metros, e recebe esse nome não devido a coloração de seu corpo, já que ela aparenta ser cinza, e sim porque o interior de sua boca é visivelmente negra, quando ela escancara a boca em sinal de ameaça. Seu veneno, considerado neurotóxico, causa paralisia, podendo levar a vítima ao óbito em apenas 20 minutos se não for tratada rapidamente. Sem tratamento, 100% dos casos das pessoas picadas morrem.
Os peptídeos encontrados no veneno da Mamba-Negra podem bloquear os canais de neurônios onde há íons que desempenham a função de enviar os sinais de dor ao cérebro. Em camundongos, seus efeitos são tão poderosos quanto à morfina.
No momento, os pesquisadores trabalham na elaboração de um analgésico com base no veneno desta cobra para tratar as dores crônicas que acometem muitas pessoas todos os dias.
O veneno de outra espécie de cobra está sendo estudado, e um peptídeo analgésico está sendo desenvolvido a partir do veneno da Cobra-Real (Ophiophagus hannah). O trabalho está sendo feito pela empresa Theralpha.

A Cobra-Real é outra espécie que entra para a lista das mais perigosas do mundo. Esta, no entanto, é considerada a top de todas, é a mais venenosa que existe. Este animal pode chegar a medir 6 metros de comprimento, e em apenas uma mordida ele libera até sete mililitros de neurotoxina, que são suficientes para matar um elefante.
O que se sabe até agora em relação ao peptídeo desenvolvido a partir do veneno da Cobra-Real, é que ele tem demonstrado efeitos muito potentes, mais até do que a morfina, e poderia ser tomado via oral, e não necessariamente necessitaria ser injetado na corrente sanguínea.
Manjunatha Kini, da Universidade Nacional de Cingapura, que estudou o peptídeo, diz que a substância é tão potente que em poucos minutos ela já está na corrente sanguínea: “Nós deixamos cair uma solução [do peptídeo] sob a língua do animal e em poucos minutos ela está no sangue”.
Diversas equipes de cientistas pelo mundo estão engajadas em descobrir uma terapia eficaz, e por que não definitiva, para a dor crônica. Enquanto uns pesquisam venenos de cobras, e anêmonas, outros desenvolvem terapêuticos baseados em moluscos e aranhas.
“Há milhares de venenos que sequer olhamos ainda. Dessa forma, temos milhões de moléculas que são drogas potenciais ainda a serem exploradas”.
Pelo Prof. Eudo Robson

Este artigo encontra-se disponível para dowloald gratuito e em PDF no site:

www.universodaquimica.com



Sem comentários:

Enviar um comentário